quarta-feira, 21 de julho de 2010

O triângulo amoroso mais exótico da História

Esfinge. Coliseu. Exércitos. Enrolação em um tapete. O soldado mais fiel. O político mais poderoso. A mulher mais inteligente.
Cleópatra VII, Julius Caesar, Marcus Antonius se enlaçam em uma história de amor trágica e épica. nomes romanos em latim ^^
O período era de transição. O governo de Roma estava centralizado nas mãos de César depois de anos como uma República.
Os interesses de Cleópatra, segundo Pilar Rivero*, são resumidos em assegurar o poder do Egito para si e seus filhos e adquirir um maior território para o país, o único independente de Roma na época.
Para assegurar-se no poder, Cleópatra buscar uma aproximação com Roma
Intrigas e guerras entre irmãos no Egito, levam Cleópatra a uma aliança com César. O casamento é visto com maus olhos pelo povo romano, mas a popularidade e o carisma de César o seguram no poder somado com Marcus Antonius, seu fiel general, como Tribuno da Plebe.
Mas a posição de César traz a traição de Crássio e Brutus.
Com a morte do político, um novo Triunvirato se forma: Otávio, Lépido e Marcus Antonius.
Otávio no ocidente, Lépido na África e o orador do discurso fúnebre de César e seu principal general, Antonius, o Oriente.
Marco Antônio atiça o povo contra Cássio e Brutus em um discurso fúnebre a César.
Cleópatra, uma vez que Otávio quer acabar com sua vida porque seria ele o herdeiro de César sem seus filhos no caminho, decide aliar-se a Antonius. O que lhe conferia proteção na política do Oriente.
Eles se casam, e o mais fiel dos soldados de Caesar toma conta de seu patrimônio ou matrimônio no caso até o momento em que cometem suicídio após sofrerem uma derrota.
Essa derrota é da Batalha do Áccio última figura quando o Senado romano os declara inimigos do povo romano e encarrega Otávio para liquidar-los. Otávio se torna o Augusto, imperador, após dar cabo de Lépido e Antônio.
Existe uma fonte, uma carta citada por Sitônio, que informa que eles teriam se casado nos rituais egípcios enquanto Marco Antônio ainda era casado com Octávia, irmã de Otávio e sobrinha de César.
Bom, vale lembrar que um dos títulos de Caesar era: "O marido de todas mulheres e esposa de todos os homens" aí a gente pensa...
Marco Antônio foi O cara; comandou toda a parte esquerda do exército de Caesar nas campanhas germânicas; diz a lenda que levava uma vida boêmia na juventude e só entrou para o exército quando fugiu de suas dívidas por bêbida em Roma; e, por um acaso, esbarrou em uma tropa romana na Judéia.
Será que esse triângulo amoroso era mais que uma linha reta com Cleópatra no meio? Talvez tenha sido triângulo mesmo, se é que me entende...
Ninguém nunca parou para perguntar se Marco Antônio, um dos maiores militares da história (e o meu favorito) também não seria marido de Caesar?
aliás tadinho dele, essa Cleópatra aí do quadro tem corpo de homem!
Problematizar tudo, eis um dos lemas do historiador...
* : texto fonte: A política externa de Cleópatra VII Filópator, por Pilar Rivero. In: Amor, desejo e por na Antiguidade. Livro nacional que, dentro dos organizadores está Pedro Paulo Funari.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

A Imagem do Zeus Humano

"Tudo que o homem já fez, um homem grego já pensou antes."
Não concordo nem discordo, só afirmo que nada foi ou é tão criativo e inovador como foi e é a mitologia grega.
Os estereótipos que formam o panteão grego são base para muitos dos personagens criados na dramaturgia, na literatura, na música, nas novelas, etc, etc, etc... A graça da vida, a roda das paixões humanas foi idealizada e representada nos deuses gregos. a primeira novela das 8 da História
Todos eles tem poderes divinos e paixões/sentimentos/desejos/vontades humanas.
E um dos mais carismáticos personagens é Zeus.
Zeus, (Ζεύς em grego antigo), é o rei dos deuses na mitologia grega.
Conseguiu se livrar do destino: ser engolido pelo titã pai Cronos como todos seus irmãos tinham sido.
Zeus teria sido criado em uma caverna de Creta. Ao alcançar a idade certa, tomou a pele da cabra que o alimentava, fez dela sua armadura (a Égide, justificando o "Zeus porta-égide" da Teogonia) e foi combater seus pai, quem derrotou.
Governou o Olimpo, lar de seus irmãos, assim como os governou.
A história de Zeus é muito conhecida e algumas contradições são visíveis devido ao fato de que várias cidades-Estado gregas queriam ligar seu passado ao nome de Zeus (como pessoas importantes cuja árvore genealógica acima da terceira geração seriam reescritas com nomes de divindades).
Mas vale focar no aspecto humano dos deuses gregos. Eles são movidos por suas paixões (vide o motivo da Íliada, a vingança de Hera e Atena) e, no caso de Zeus, sua parte humana é expressa em suas aventuras "amorosas".
A idéia de amor no mundo grego, o "amor" heterossexual, não devia ser muito popular, uma vez que a posse guerreira, o sequestro, o saque, o estupro, eram os métodos de "amor" dos guerreiros. Vide na Íliada as escravas e a briga entre Aquiles e Agamenom por causa da recém-escrava Briseida.
E o tesão masculino é suprido por estupros. Incluindo o tesão de Zeus que utiliza de várias artimanhas para conseguir "dormir" com suas cobiçadas fêmeas. Ele se transforma em cisne, águia, touro, marido, etc...
Zeus é aquele que aplica a justiça, no entanto, come sua mulher (LITERALMENTE) cujos filhos deveriam superar o pai em poder e ignora o direito monogâmico das humanas.
Aí é que está: a idéia monogâmica na Grécia Antiga. O jovens atenienses seriam estimulados a manter relações com homens mais velhos (esfregações na verdade) nos gimnásios da metrópole.
E, por causa dessas muitas aventuras sexuais de Zeus surge na mitologia um personagem que me intriga: Hera.
Hera apresenta a luta por uma monogamia que na verdade não existe para a alta sociedade, quer dizer, pelo menos não para a alta sociedade (baixou o Marx: a classe dominante).
Quase ninguém gosta da Hera tirando, talvez, a minha namorada. Ela quer ferrar o Hércules, quer ferrar as amantes de Zeus, quer ferrar os troianos. Ela ferra todo mundo. Porque Zeus, bem, "ferra" todo mundo. isso aqui é blog de família, neah?
E o ciúmes de Hera aparece como um estimulante e movimentador das encrencas e lendas da mitologia grega.
Hera é linda e poderosa, o único ser mais poderoso que ela seria seu marido e irmão, Zeus. Diferente da mulher ateniense que, em oposição a romana, ficava trancada dentro de casa.
A figura de Zeus foi relida e explorada diversas vezes em diversas formas. mas botar Zeus com armadura medieval em Clash of Titans doeu...
Sua imagem aparece até na idealização de um Deus cristão oni-potente. Afinal, não é uma influencia direta da mitologia greco-romana um Deus barbudo de cabelos brancos?
Mas a primeira imagem de Zeus, aquela cultuada na Grécia Antiga, não seria uma expressão do que todo o homem sonhava em ser? Rei de seus semelhantes, subjugando sexualmente todos os que quisesse. Impondo justiça aos subordinados e ditando a vida dos que o cercam como bem entender?
Zeus é menos que humano para os nossos dias, ele é um animal com tesão animal.
E uma discussão muito bacana sobre os mitos de Zeus aparece em Clash of Gods : ZEUS (trdução deles: "O confronto dos deuses: ZEUS"), no History Channel. Muito bacana mesmo.

Anacronismo Político

aproveitei o post para homenagear grandes mestres
Quando a gente fala de comunismo, quais são as imagens que vem?
Fidel... Stalin... Marx.
O que a gente esquece é que o comunismo/socialismo é anterior a Marx, que, por um acaso, nasceu no dia 05/05/1818 e morreu em 14/03/1883. No entanto, Marx entrou em contato com o pensamento socialista em Paris e o que escreveu sobre ele em parceria com Friedrich Engels é denominado socialismo científico com a definição das lutas de classe.
A idéia do socialismo é bem clara: sociedade igualitária. Reforma agrária, igualdade social e econômica.
Uma bandeira muito parecida com as idéias de Jesus, O cara. Jesus era um revolucionário de palavras muito mais poderoso que qualquer outro que já passou pela Terra.
Uma bandeira que nosso amado John Lennon traduz em melodia com Imagine em 1971.
Charles Chapplin, já foi acusado de levantar a mesma bandeira, por um tempo, no marcathismo americano.
No entanto, sob esta mesma bandeira de igualdade, regimes totalitários foram erguidos com o nome de comunistas.
Agora qualquer manifestação política, aparece uns maluco com camiseta do Che em Sierra Maestra, Marx, movimento sem terra e virou um vuco-vuco modista do qual fazem parte inúmeras pessoas que nunca leram Marx, Lenin ou qualquer outro cara que escreveu sobre socialismo.
E, graças ao governo Vargas e o poderio americano, o nome comunista significa, para uma galera que não o entende por um outro lado, como gente que come criancinhas, ritual cabalísticos, etc, etc...
No entanto o que é preciso na visão socialista é uma atualização. Um esclarecimento sobre os desejos dessa corrente filosófica política moral e econômica que coincide com os interesses de muitas outras correntes religiosas e econômicas.
O que eu quero dizer é: toda vez que se toca no nome comunista, socialista ou o escambau a quatro, um preconceito vem, por causa das conseqüências catastróficas que regime totalitaristas que usaram esse nome de fachada trouxeram.
O próprio nome comunismo já é um anacronismo. O sistema que Marx propôs era para uma época de revolução industrial, não o sistema financeiro que temos hoje. O socialismo necessita de um rebatismo e uma releitura.
Os governos de esquerda crescendo na América Latina, se não fizerem besteira, como estão fazendo, levarão em um processo lento e gradual a instalação de um regime mais parecido com o socialismo utópico possível (leia-se: ações sociais grandes e maiores do que leis e controles a favor de industriais e os poderosos tubarões).
É preciso recriar o socialismo, longe e limpo de tudo que possa trazer essa corja ignorante que se chama de socialista (vem cá meu bem, bolsa família eu até engulo, agora, PAC não rola) próximo.
O movimento socialista é utópico em si, e não pode deixar de se-lo.
Essas ligações de socialismo com ateísmo, socialismo com marxismo, socialismo com regimes totalitários precisa acabar.
O próprio movimento socialista tem que erguer a bandeira branca. Ficar nas cinzas por umas booooas gerações e resurgir quando as pessoas tiverem uma consciência mais humana.
Por enquanto, é um bando de crianças ou intelectuais que... Bem... São só intelectuais sem mais aquela militância estudantil das Diretas Já, dos Cara pintada, de bomba na época da ditadura...
A partir do momento em que a corrente socialista dominou a História das escolas públicas E particulares, ela se balanizou e acabou.
Talvez a História Nova seja a própria salvação do Socialismo.

terça-feira, 13 de julho de 2010

História e Memória - Le Goff e esse blog (ou não)

A quinta parte de Le Goff e a última de Gourhan, em quem ele se baseia por todo o capítulo, são dedicadas a memória que surge em função da comunicação eletrônica.
Le Goff escreve que os computadores permitem um acúmulo nunca visto antes de memória e conhecimento e que a facilidade de acesso é inédita também.
A partir disso, a "memória eletrônica" é a primeira a permitir que a memória individual exista também. É claro que ela sempre existiu, mas se tratavam de figuras importantíssimas que influíram no coletivo.
Agora todos podem entrar para a História. Lembrando que a História é escrita a partir do interesse do historiador, podemos corrigir a frase anterior de minha autora, porque o Le Goff nunca erra e troca-la por: agora, qualquer um pode registrar sua memória na memória coletiva.
Enquanto o coletivismo memorial levou a conseqüências catastróficas, a transmissão eletrônica permite a lembrança e a humanização do individual. Tem gente que afirma que nos tornaremos números "você é só mais um no orkut", por exemplo.
No entanto, esse mais um vai ser diferente do outro um, nem que seja por algumas fotos e uma descrição do "quem sou eu" original.
O sentimento nacionalista morre, eis a chance do sentimento global com a valorização do individual sem estereótipos.que puta conclusão de menininha
E sobre o acúmulo de memória em pequenos aparelhos eu comecei a lembrar dos holokrons do Star Wars (há! Eu tinha que falar disso). Onde pequena caixas trazem registros de povos e populações inteiras e eles se lançam em combate para te-las.
Le Goff é incentivador da informação digital e, por tabela, da popularização do conhecimento, que nunca podemos esquecer que é o objetivo desse blog: popularização e democratização do conhecimento histórico.

História e Memória - Memória Nacional

Le Goff foca na construção das identidades nacionais quando chegamos a parte da memória impressa. de longe a mais legal
Jornais. Informação massificada. Opinião pública. Mobilização. Revolução. te lembra alguma coisa...? Depois da Idade Média... 1789...
Uma coisa leva a outra. A memória coletiva no pós-Idade Média é exposta em museus, calendários festivos nacionais, laicização de territórios, etc...
A escolha de dias festivos, exprime uma idéia de identidade nacional desejada, Le Goff ilustra com o exemplo francês: quais fatos da Revolução Francesa deveriam ser lembrados?
"A história é escrita pelos vencedores." Não seria esse um efeito colateral da manipulação da memória coletiva?
Meu exemplo nacional preferido: o livro de Narloch. O guia politicamente incorreto do Brasil tenta provocar a opinião pública revelando fatos encobertos pela leitura de nossa memória coletiva nacional idealizada.
O auge da memória coletiva foram o nazismo e o fascismo. Idealização de feitos do passado e adoração aos líderes políticos. As conseqüências desse tipo de uso da memória coletiva são catastróficas. Países que foram traumatizados com esse tipo de linguagem totalitária reconhecem isso (aí podemos incluir também o Regime de Terror no pós-Revolução Francesa).
O que me assusta, no entanto, são nações que tiveram a mesma forma de pensar e não identificaram ou se traumatizaram com isso.
"A história é escrita pelos vencedores".
Eis que o grande vitorioso dos conflitos contra regimes totalitaristas também tem um cunho nacionalista.
Sim, estamos falando dos EUA. Sua visão para o país é de perfeição. Alienação total.
As aulas de American History são, de fato, um discurso patriota decorado sobre os feitos heróicos dos presidentes estadunidenses. porque é um bsurdo chamar de americano
Palavras de quem freqüentou uma High School.
O que é Guatanamo se não um campo de concentração?
Não me venham com o papo "A guerra do Vietnam..." A guerra do Vietnam não foi em território estadunidense como as guerra de Hitler, Mussolini e o Regime do Terror foram em territórios europeus.
A mídia fez a parte dela na guerra do Vietnam, a dor fez a parte dela e muito mais na segunda guerra mundial.
Então, um país de cunho nacionalista que se esconde sob o nome de liberdade e democracia prevê sua posse de armas nucleares como a garantia da paz mundial no sistema de Direito Internacional.
Mussolini e Hitler foram adorados por um certo tempo. Obama também o é e Lula quer ser. fazer filminho foi uma puta falta de sacanagem.
E todos os outros presidentes estadunidense também são. Bush talvez não, porém, ele é exceção (e outro acho que Nixon, da guerra do Vietnam...) por causa de uma mídia crítica e opiniões internacionais fortes.
Esse é o caminho da salvação estadunidense não Canada, não vou ignorar sua existência: uma mídia crítica e uma comunidade internacional que não abaixa a cabeça. Aliás, não tem mais o porquê abaixar a cabeça mesmo, só a gente não foi afetado pela crise...

História e Memória - "Fazei isto em memória de mim*" (e tocam o sininhos...)


Com o advento da escrita, estudos filológicos são apresentados por Le Goff para com os conceitos de memória desde os gregos até a Idade Moderna.
Le Goff medievalista, caracteriza como memória escrita, a cultura medieval ocidental.
Há uma idéia explorada sobre a mnemotécnica e seus avanços através do tempo. A mnemotécnica são técnicas e estudos sobre e como melhorar a memória que sempre foi sinal de inteligência. A idéia de capacidade intelectual sempre foi vinculada, desde a Antiguidade, com a capacidade de memorizar do individuo.
Pitágoras, afirma Le Goff, era tão inteligente que lembrava até da sua vida passada eu quero puxar cadeira de mestrado só pra ficar sabendo dessa história.
A mnemotécnica estuda, portanto, as raízes da memória no ser humano e como maximizá-la. A mnemotécnica tem um pé no ocultismo, porque atribuíam origens místicas a memória. Alguns teóricos citados por Le Goff foram perseguidos por seus estudos.
No entanto, a memória coletiva se apega também a religião católica. Le Goff dá alguns exemplos bíblicos para acreditarmos que o ensino católico é a preservação da memória e o culto cristão é comemoração. Portanto, os hereges e os católicos se enlaçaram tanto quanto a História e a Memória.
A idéia da mnemotécnica como capacidade intelectual nunca foi totalmente exterminada até hoje temos apostilas para melhorar a memória, etc... mas ela saiu do foco com o advento da massificação da escrita, até então, quase-monopólio da Igreja.
Com o advento da imprensa, o saber passa a ser impresso e presente. É só consultar um livro, e pronto, lá esta o que precisas.
Artigos científicos são impressos e o leitor pode compartilhar descobertas contemporâneas. Científicamente um avanço enorme. Até então, a linha de divisão entre memória escrita e oral era muito sutil.
E a imprensa traz muito mais do que folhas para a memória coletiva.

*= frase tirada da missa pra quem nunca assistiu uma ou não se lembra...

segunda-feira, 12 de julho de 2010

História e Memória - inscrevendo a História

Com o avanço da comunicação simbólica, é perceptível no maior esquema o ovo e a galinha uma mudança na função da memória coletiva.
O período da transmissão por inscrições é a História Antiga (Egito, Pérsia, Roma, Grécia...). Essa transmissão através da inscrição (de estelas, monumentos, um principio de escrita) vem para registrar eventos históricos. Eventos históricos, segundo Paul Veyne, seriam fatos que se destacam sobre uma uniformidade.
A memória coletiva é marcada com inscrições, provocando mudanças e registros, o que indica que a História Política e a mobilização social começaram a se complexar.
Lembra do Sennet?
Então, naquele mesmo texto do Flesh and Stone ele discute a importância da imagem no mundo romano, como a idéia do culto ao imperador, e a idéia da perpetuação de seus feitos em pedra, no comando de um império cuja riqueza se mede em carne, em numerosos escravos.
A idéia dos monumentos de Roma está ligada diretamente com personalidades, como o Fórum de Trajano, o novo Pantheon que Adriano manda erigir para provar seu valor, o desperdício de Nero em sua nova morada e a construção que marca o fim do império romano: o maior complexo de termas já feito, construído a mando de Caracala.
Le Goff foca nesse tipo de ação e não nas personalidades em si. Aliás, efeitos e causas, as inscrições, por exemplo, marcavam as comemorações e lembravam o que o Estado queria que fosse lembrado e comemorado.
O inicio da escrita, a inscrição, aparece para registrar fatos fora do cotidiano de uma civilização.
Vale ressaltar que esse tipo de documento oficial é e deve ser sempre explorada e re-explorada e talvez além de aumentar o número de tipos de fontes e incentivar historiadores a olharem com outros olhos para os vestígios do passado, é necessária uma releitura histórica dessas estelas, obeliscos, aquedutos, arenas, etc... A História é feita no presente, e muda como o próprio presente.
Um exemplo pertinente é a crença do historiador Serge Gruzinski, em A Colonização do Imaginário, de que o significado da epigrafia asteca não está apenas nas formas e seqüências que suas representação pictográficas estão dispostas e que há muito significado nas cores utilizadas, dando outro olhar a fontes já tão exploradas e mesmo assim trazendo novas informações.
E viva a História Nova!

História e Memória - A memória que não embarcou no navio negreiro

POSTAGEM EM DIÁLOGO.

Le Goff aborda a memória coletiva transmitida oralmente apenas nas sociedades sem escrita, ele também a denomina memória étnica.
A memória coletiva e sua transmissão são fatores de unificação cultural do grupo. A mitologia é um forte fator na memória oral.
O autor utiliza como exemplo o costume de batizar indivíduos com o nome de ancestrais em povos sem escrita no Congo, como uma forma de preservar a memória coletiva.
Essa prática não se restringe ao Congo, mas também é possível de se ver em outras tribos e reinos africanos.
Há, no Brasil, uma discussão sobre os ritos do Candomblé que envolve culto aos orixás¹ e aos ancestrais². No entanto, não se tem certeza do que seja um ou outro, e alguns ancestrais foram confundidos com orixás.
Nossa problemática histórica aqui não é distinguir um do outro e sim, sensibilizar a perda desse costume e o golpe que isso trouxe a memória coletiva desses grupos.
Se a tradição tivesse sido mantida quando esses grupos foram trazidos como escravos para o Brasil, até hoje a diferença estaria clara entre orixás e ancestrais.
Poderíamos supor que o choque cultural e a condição de escravos em uma sociedade que possuía a escrita foram condições para a repudio do velho costume do batismo com nomes de ancestrais, no entanto, se alguém for estudar as conseqüências da memória coletiva dos escravos e sua influência no Candomblé³ e em outros cultos e religiões afro-descendentes não poderia esquecer da importância do mito de origem na memória étnica e, portanto, da religião. Uma das possibilidades para o fato teria sido a inclusão do pensamento cristão nesse povo, com sua visão linear do tempo.
Mas, como o próprio Le Goff, devemos lembrar da figura destacada por Leroi-Gourhan(te lembra alguém?): o responsável pela memória coletiva: o pajé, o aedo, a sacerdote, o ancião... Nas sociedades sem escrita difundida. chama de Gohan que é bem mais fácil
Então, adicionemos em nossa problemática o fato de que os anciãos não eram trazidos para o Brasil como escravos (uma vez que o trabalho a que estariam destinados exigiria rigor, que também era exigido na viagem) e que seriam os portadores da memória étnica daqueles povos.
Se existe memória existe também função para essa memória e Le Goff define no período da Pré-História à Antiguidade as funções da memória coletiva como: a genealogia das famílias importantes (afirmando seu prestígio e descendência divina), o mito de origem (que é o símbolo de coesão coletiva) e o saber técnico religioso (a figura do preto-velho africano que carrega o conhecimento mágico e místico).

1= Divindades da religião, anacronismo didático: valeriam como os deuses gregos.
2= Ritos mediúnicos que envolvem sacrifícios e oferendas aos ancestrais familiares. O culto Egungun, por exemplo.
3= Lembrando que o Candomblé é uma religião formada pelos escravos em si, e não uma religião africana por natureza. Ela é uma religião afro-descendente.

História e Memória

História e Memória é um livro escrito por Jacques Le Goff, especialista em história biográfica, Idade Média e em antropologia histórica e medieval, e faz uma análise sobre a memória coletiva através dos tempos.

Le Goff (1924 - ) é a terceira geração da Escola dos Annales, fundada por March Bloch, portanto, ele é a figura máxima viva da História Nova.

Antes de mais nada, é necessário caracterizar o que é memória coletiva que, de uma maneira simples, é a memória que um grupo possui sobre si e sua história. Seus ritos, seu passados, seus heróis, suas transformações.

Portanto, História e Memória são dois temas que se envolvem e se diferenciam. A memória que Le Goff estuda é por ele abordada em sentido de leque: do micro, individual e biológico, ao macro, coletivo e histórico.

O foco do autor é o coletivo-social, no entanto, ele levanta a importância da memória individual: a física (como os efeitos na formação de determinado discurso histórico) e metafórico (em uma comparação com a memória coletiva e suas característica de constante re-interpretação).

Essa comparação metafórica merece uma explicação mais aprofundada: nossa memória individual, toda vez que é buscada é re-lida e re-interpretada, Le Goff acredita que assim também o é com a memória coletiva: toda vez que a população atual busca na memória coletiva algum fato, faz uma releitura do fato, uma interpretação diferente das anteriores, contemporâneas com o fato ou mesmo posteriores a ele.

Para aplicar o caráter didático que o texto tem, vou dividir a resenha como Le Goff divide seu texto, sob o seguinte esquema:

è Introdução (este post)

è A memória oral nos povos sem escrita

è A memória inscrita

è A memória escrita

è A memória impressa

è A memória eletrônica

Eu vou seguir o mesmo esquema, em forma de resenha, explorando o tema mais do que falando do texto em si...

Enjoy it.

sábado, 10 de julho de 2010

As diferenças entre eu e o meu cachorro

Eu tenho uma cadelinha, carinhosamente ela tem um nome. Eu também tenho um nome.Nossas diferenças biológicas são simples e claras, eu sou um homem, ela, um cachorro.Só que eu sou um ser político. Tenho minhas opiniões e colocações.
Ela não tem um mundo dela. Eu tenho um mundo meu, onde a política é controlada pela minha espécie. Tirando um desenho animado não muito famoso e que eu não lembro o nome, nunca houve uma organização política canina de domínio global.
E nunca houve nenhuma organização política canina. Por que? Porque eles não se organizam, talvez eles não consigam se comunicar de uma forma tão clara quanto nós.
Se não existe uma comunicação desenvolvida, não há meio de se destacar interesses em comum, e os individuais se resumem a ações animalescas. Uma mordida, um latido, um abanar de rabo.
Tá, é meio contraditório observar um cachorro antropologicamente, mas o que nos diferencia é exatamente isso: nós temos as características necessárias para se organizar, balancear interesses em comum e tomar ações onde são claros os objetivos dos lados divergentes sem ações animalescas (sem ofender os animais e desconsiderando seu porte de armas nucleares).
E toda essa viagem é a importância que o poder da linguagem tem para definir um ser humano como ser humano.
Essa é uma corrente da Pré-História, que traz a linguagem como o divisor de águas entre o Homem e o Animal, considerando o inicio da humanidade o momento em o Homem desenvolveu uma linguagem complexa e abstrata.
Outra corrente traz o bipedalismo ereto como tal divisor, comparando a força e agilidade humanas com dos outros animais.
Que bom, veremos então o que veio primeiro: o bipedalismo (possibilitando então a linguagem) ou a linguagem (possibilitando a sobrevivência pré-bipedal).
Existem provas de um e outro, porém, para validar essas provas a comunidade científica deve julgar o que pode ser considerado bipedalismo e o que pode ser considerado linguagem com efeitos político-comunitário.
Mostrando que nossa linguagem não é lá tão abstrata e eficiente assim até hoje...

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Marxista não, por quê sim?!

Muitas ciências, incluindo aí História e Relações Internacionais, pelo menos, tem uma tal de linha marxista.
A linha marxista ganha uma bala quem adivinhou é uma linha de interpretação do mundo (ou da História no caso) baseada na visão exposta pelo alemão Karl Marx e seu namorado como diz a lenda colega Engels em toda a sua obra. Claro ninguém lembra dele como um machista ou miserável, mas sim como o grande pensador que mobilizou partidos comunistas por toda a Europa.
Qual é a visão do mundo então? Que a História é definida pela constante luta de classes. Interessantíssimo de ler (sério, e importante também).
Essa visão domina as salas de aulas hoje em dia. Quem aqui nunca desenhou uma pirâmide de classes na escola? Os livros didáticos, em sua grande maioria, apresentam um cunho marxista.
A parte das Relações Internacionais chamada de corrente marxista ou radical é aquela que traz como visão do panorama internacional não os interesses das nações como movimentadores do sistema, e sim as instituições e ideologias, que não reconhecem os limites políticos como fronteiras.
Lenin é a grande base da corrente internacionalista marxista que nega tanto à corrente idealista (que crê em uma ordem acima dos interesses dos países como o Direito Internacional ou a própria ONU) e a realista (que crê no poder individual das grandes potências como o poder maior na "comunidade internacional"). Resumidamente, claro.
Mas, voltando a História, a linha marxista tem concorrentes fortes como a Nova História, onde a revolução (o resultado e a parte mais importante de um período na corrente marxista) não passa de um evento dentro de um grande panorama. O importante para a História Nova (olha Marc Bloch aí gente) não se resume na revolução e nas suas causas, mas tudo antes e depois disso.
A história Marxista acaba por se definir como a história da política, e a História Nova, a história da humanidade.

domingo, 4 de julho de 2010

Olhar e acreditar, ver e obedecer

Flesh and Stone. Richard Sennet. (Carne e Pedra na versão brasileira)
Professor de Sociologia, iniciou seus estudos em História quando concluiu seu PhD em Harvard.
Em Flesh and Stone, ele relaciona o corpo humano no espaço urbano, mas eu só vou escrever um pouquinho sobre o capítulo em que Sennet aborda a Roma Antiga (ele não lembra o Elton John?).
Sennet expõe a importância da imagem para o povo romano. Olhar e acreditar. Ver e obedecer.(talvez não com essas palavras...).
Quando a gente vai estudar o tempo de Júlio César e o conseqüente império romano, a questão mais explorada é a importância da engenharia romana. (lembrando, Império Romano, não república)
Julius César, o marido de todas as mulheres e esposa de todos os homens, inicia o brilho de sua carreira militar quando cruza o Danúbio construindo uma ponte até então nunca vista, para cruzar o território com suas tropas, descer a porrada nos germânicos, voltar e destruir aquela magnifica construção, simbolizando que César pode fazer o que nenhum outro homem pode e faze-lo quando desejar. A ponte de César acompanha uma imagem romana de poder total.
E, depois da morte de César, Otávio empreende sua conquista pela herança e assume o título de Augusto. O império começa. (soou um pouco Darth Vader, néh?)
Ao longo dos séculos, os imperadores vão indo e vindo, e uma empreitada pela segurança no poder é expressa com tentativas de construções mais e mais magníficas. O imperador anterior é um ego fantasma que deve ser superado para se segurar no poder com o apoio do povo.
O fórum de Trajano, O Pathernon de Adriano, As termas de Caracala.
O Coliseu, erguido acima do Domus Aurea de Nero, construído a mando de seus sucessores, para que a imagem de Nero fosse esquecida pelo povo romano, mostra que a disputa engenhosa era consciente e exemplifica a idéia de Sennet.
Para que a população acreditasse naquele ser divinizado fielmente, ou para que ele tivesse o próprio ego posto a prova, os monumentos eram erguidos e fincados na vida romana. Sua memória e opinião coletivas eram drásticamente afetadas por essas imagens.
"O romano acreditaria e obedeceria o que visse."
Um exemplo filológico disso é que, segundo Paul Veyne, para os romanos, o céu noturno (que para nós é um infinito) era uma manto que cobria a terra.
Essa relação olhar e acreditar era a base da popularidade romana, e um dos maiores populistas de todos os tempos (olha, um anacronismo), Júlio César, talvez só tivesse conseguido centralizar o poder em suas mãos porque percebeu isso e conseguiu utilizar-se da engenharia para benefício próprio somando a sua capacidade diplomática e persuasiva fantásticas.